Naquela noite, a mais bela das noites, havia sossego à hora em que tu chegaste. Eu fui buscar-te ao portão e caminhámos com cuidado na escuridão, de mãos dadas, evitando as pedras soltas que nos denunciariam o caminhar. Naquela noite, o teu corpo estava quente da caminhada longa e apressada que fizeras e trazias contigo o mais belo dos teus sorrisos. Quando nos abraçámos pousaste-o sem o saber, na curva dos meus seios e ali ficou, cravado no coração. Depois despimo-nos com a urgência da paixão e amámo-nos em cada gesto, em cada beijo que lentamente dissolvia a saudade... A tua boca procurou-me todos os recantos entre as coxas que se abriam para ti, beijou-me, a língua saciando a falta de tantos dias, entrando em mim, possuindo-me sem pudor... Naquela noite, a mais bela das noites, bebemo-nos como se fossemos água, e os corpos foram um oásis no deserto das nossas solidões, dos encontros eternamente adiados. Naquela noite, depois do amor, ficou o abraço das peles nuas que se pediam, adiando a despedida doída. E conversámos sussurrando, e sorrimos muito, muitas vezes, as mãos deslizando nos corpos, escorregadias como peixes, partilhando o carinho só possível quando se sabe que nos nossos braços está a pessoa amada. Naquela noite pertencemo-nos.
Recordo-a muitas vezes, a noite mais bela. Tenho medo que o tempo a apague, a roube de mim, lhe esbata os contornos tão nítidos, como se tivesse acontecido ontem. Por isso às vezes o meu corpo relembra-a, para a poder eternizar, essa noite onde fomos tão felizes com o pouco que tínhamos. E não quero perdê-la nunca porque eu fui muito feliz. Porque tu foste feliz.
Hoje apetece-me dizer-te que sem ti, só metade de mim continua a viagem. O corpo, carrego-o comigo... Mas a alma... levaste-a contigo.