segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Amanhã talvez

Os cães estão inquietos. Agitam-se, correm loucamente até ao portão e regressam ofegantes. Choram. Talvez seja da chuva. Também não gosto deste som da água caindo nas árvores, do vento agitando a madeira, obrigando os troncos a vergarem-se. Tomei o comprimido e aguardo a calma... Queria dormir hoje, um sono sem sonhos, sem insónias, sem angústia. Estou cansada. A igreja gelada, as pessoas a chorar, o descontrole no momento em que a urna desce à terra... Odeio funerais. Lembrei-me de ti, avó, de quando te desceram à terra e me deram a chave da tua urna presa com uma fita de seda negra. Chorei muito, chorei à vontade, hoje era possível deixar cair a dor... Quando regressei sentia-me tão esfarrapada que me apeteceu ouvir uma música, vezes sem conta, até a dor passar. A única música possível. Mas a dor não passou. Entendes-me? Não passou. E agora à noite, parti um copo ao jantar. Chamaram-me desastrada, distraída, ralharam-me... e era só a merda de um copo. Como podia eu explicar que o deixei cair porque alguém, que eu não via, me agarrou a mão, a puxou com força? Como contar que me assustei, que senti medo? Fantasmas não existem, rir-se-iam de mim... Talvez eu esteja a ficar louca...
Amanhã é outro dia. Respiro fundo e espero. Amanhã será talvez melhor.

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