Habituamo-nos a tudo. Sem o notarmos, habituamo-nos a viver sem tempo, ao equilíbrio no arame, a esta vida na corda bamba, ao trapézio sem rede. Habituamo-nos à indiferença, ao silêncio e ao vazio. Ao cansaço. Habituamo-nos à saudade e a dar murros em ponta de faca que nos cortam o ar e nos deixam sem sangue... Habituamo-nos. E vamos perdendo vida todos os dias, vamos perdendo tempo e momentos, instantes fugazes de alegria mas que eram o respirar do corpo exausto. Habituamo-nos a viver sem água, numa sede eterna que deixa os olhos sem brilho e o coração despedaçado... Habituamo-nos a calar os gestos de amor, as palavras de desejo, a paixão. Deixamos de pedir, de lutar, de sonhar. E até a isso nos habituamos quando um dia percebemos que já nada esperamos, nenhum comboio onde embarcar, nenhum navio onde partir, nenhum horizonte no olhar... No solitário cais de embarque da vida, sentamo-nos numa apatia silenciosa, perdidos os sonhos, vencida a coragem, invisíveis aos olhos do mundo e dos homens. Habituamo-nos. Passamos a ser sombra e escuro, vazio e tristeza... e até a isso nos habituamos. Para podermos sobreviver.
domingo, 25 de outubro de 2009
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